LIKE OU DISLIKE: EIS A QUESTÃO

22 Outubro 2021

LIKE OU DISLIKE: EIS A QUESTÃO

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Para os mais abstraídos das redes sociais, foi mais uma segunda-feira normal, mas para os utilizadores leais das redes sociais Facebook, Messenger, WhatsApp e Instagram, o dia 4 de outubro de 2021 foi caótico. As plataformas sofreram uma falha colossal a nível mundial, que durou mais de 6 horas, 2 anos depois da última interrupção mais significativa do Facebook, que decorreu quando um erro técnico afetou os seus websites por mais de 24 horas – um lembrete de que um erro, por pequeno que seja, pode afetar e paralisar até mesmo as empresas mais poderosas. Desta vez, segundo o vice-presidente de infraestrutura do Facebook, Santosh Janardhan, esta foi a causa do problema:

“As nossas equipas de engenharia descobriram que as alterações de configuração nos backbone routers que coordenam o tráfego de rede entre os nossos centros de dados causaram problemas que interromperam esta comunicação. Esta interrupção do tráfego de rede teve um efeito de cascata na forma como os nossos centros de dados comunicam, pondo fim aos nossos serviços.”

A conexão de backbone da empresa entre os data centers foi desligada durante a manutenção de rotina, o que fez com que os servidores DNS ficassem offline. Esses dois fatores combinados tornaram o problema mais difícil de corrigir e ajudam a explicar por que os serviços ficaram offline por tanto tempo. Por outras palavras, os próprios técnicos da empresa “fecharam o carro com as chaves lá dentro”.

Esta interrupção surge após um período bastante conturbado para o Facebook, que tem sido alvo de críticas severas após uma ex-gerente de produto da empresa, Frances Haugen, ter distribuído a cache de páginas de pesquisas internas para os meios de comunicação, legisladores e reguladores, dando relevância ao facto de o Facebook ter conhecimento do impacto das suas redes sociais no desenvolvimento cognitivo dos jovens utilizadores. Esta afirma que os documentos partilhados – publicados pelo Wall Street Journal – provam que o Facebook priorizou repetidamente o “crescimento em detrimento da segurança e bem-estar” dos utilizadores. Para além da entrevista impactante no programa “60 minutes”, a mesma testemunhou perante uma audiência com o Senado como o Facebook usa incorretamente os dados dos mais jovens e outros utilizadores.

Por outro lado, notícias sobre o nível de privacidade e segurança dos dados são os temas escandalosos que mais frequentemente alcançam as capas dos jornais. Recentemente, uma empresa de pesquisa chamada ‘Privacy Affairs’ revelou que os dados de 1,5 bilhões de utilizadores do Facebook foram encontrados à venda num fórum de hackers. De acordo com o relatório da empresa de pesquisa, nomes, endereços de e-mail, locais, géneros, números de telefone e informações de ID de utilizadores do Facebook foram encontrados no fórum. Não nos podemos também esquecer do escândalo em 2018, quando foi revelado que a Cambridge Analytics coletou e utilizou dados para influenciar a opinião de eleitores em vários países, incluindo dados de mais de 87 milhões de utilizadores, 70 milhões só dos EUA. Alegadamente, a campanha presidencial de Donald Trump, em 2016, usou os dados coletados para construir perfis psicográficos, determinando os traços de personalidade dos utilizadores com base na sua atividade no Facebook, recorrendo a técnicas de microdirecionamento. Deste modo, segundo os especialistas, isto permitiu exibir mensagens personalizadas sobre Trump para diferentes eleitores dos EUA em várias plataformas digitais.

Neste seguimento, a Sr.ª Haugen não foi a primeira ex-funcionária a denunciar a empresa: em abril de 2021, Sophie Zhang, ex-DataScientist publicou um memorando repleto de exemplos concretos de chefes de governo e partidos políticos no Azerbaijão e em Honduras que utilizaram contas falsas para influenciar a opinião pública. Em países como Índia, Ucrânia, Espanha, Brasil, Bolívia e Equador, a ex-DataScientist encontrou evidências de campanhas coordenadas de vários tamanhos para impulsionar ou impedir candidatos ou resultados políticos, embora nem sempre determinasse quem estava por trás deles. O memorando é um relato condenatório das falhas do Facebook; é a história do Facebook a abdicar da responsabilidade por atividades malignas praticadas através da sua plataforma que podem afetar o destino político de nações dentro e fora dos EUA.

Enfim…

Existe ao dispor de qualquer interessado uma enorme quantidade de notícias, denúncias e escândalos que implicam o Facebook, Instagram e WhatsApp, mas é também de conhecimento público que os escândalos relacionados com estas plataformas tendem a esquentar muito antes de esfriar rapidamente. Durante um curto período existe uma revolta a nível global, com utilizadores a apoiar movimentos como #DeleteFacebook e outros que exigem a desmonopolização destas plataformas, mas, no final, tudo volta ao normal e estes tumultos não passam de tempestades efémeras.

Em suma, a brusquidão desta falha massiva do Facebook, Messenger, Instagram e WhatsApp destaca o nível impressionante de precariedade que estrutura a nossa economia de trabalho e o mundo social cada vez mais mediados digitalmente.

Catarina Ribeiro
Investigação e Desenvolvimento